Sr. Presidente, Sras. Deputadas e Srs. Deputados,

Nesta noite quero retomar um debate que levanto há 2 anos, da mais alta relevância: a prática de infanticídio em algumas aldeias indígenas em nosso País. A prática de infanticídio tem acontecido em algumas aldeias indígenas que seguem um código cultural, muitas vezes centenário, pelo qual crianças gêmeas e crianças com deficiências físicas são sacrificadas e mesmo enterradas vivas.

Sr. Presidente, em pleno século XXI ainda convivemos com essa realidade!

A Declaração Universal dos Direitos Humanos consagra que todo ser humano tem direito à vida. O art. 5º da Constituição Federal também estabelece que todo cidadão tem direito à vida. A Organização Internacional do Trabalho também não aceita violação do direito à vida.

Hoje tive oportunidade de representar a Comissão de Direitos Humanos desta Casa em visita a um casal de índios, pais de trigêmeos. As crianças estão em Brasília para escapar da tradição do povo do qual a mãe é originária, que exige, em caso de gêmeos, o sacrifício de uma das crianças — imaginem em caso de trigêmeos!

O assunto é muito complexo e provoca diferentes reações. Não vejo como entrave o sistema jurídico, nem o nacional nem o internacional. O próprio Presidente Lula, em 19 de abril de 2004, baixou um decreto determinando o cumprimento de convenção da OIT sobre a importância de preservar tradições e costumes dos povos indígenas, desde que respeitado o direito fundamental à vida.

A prática do infanticídio não se justifica, por mais que antropólogos queiram defender a tradição e códigos culturais de determinados povos. Não são poucas as crianças sacrificadas por ano neste País vítimas de um código cultural que muitas vezes se sobrepõe ao mais elementar senso humano: preservar a vida.

Sr. Presidente, precisamos de políticas bem definidas no âmbito do Governo Federal e dos Governos Estaduais para conseguir, por meio de convencimento aos chefes tribais, acabar com essa prática. Felizmente, muitas aldeias indígenas já aboliram o costume, compreendendo o valor da vida.

Não é justo um código cultural atribuir àcriança que nasce por último, em caso de gêmeos, o mal. Isso é um mito, uma lenda.

Temos de incentivar esse debate nas aldeias. Muitos fóruns e seminários precisam promover essa discussão. Imaginem uma mãe vendo seu filho, logo depois de cortado o cordão umbilical, ser jogado num buraco e coberto com terra, ainda vivo! Precisamos entender esse processo e contribuir para que essa prática abominável seja eliminada.

Por fim, Sr. Presidente, neste Dia Internacional da Mulher, quero homenagear as mulheres brasileiras na pessoa da mãe de Iganani, que se rebelou contra o código cultural de seu povo para salvar a filha. Nascida deficiente, a menina estava fadada a ser enterrada viva, e só não o foi porque sua mãe se negou a entregá-la, acreditando num melhor destino para as duas. A essa mulher rendo minha homenagem maior, a ela que motivou o surgimento da organização ATINI, que na língua suruwahá significa voz — no caso,uma voz pela vida, a voz que clama.

Sr. Henrique Afonso
Sessão: 029.1.53.O
Data: 08/03/2007